segunda-feira, outubro 31, 2005

Novembro...

Novembro...

VL não gosta do mês de Setembro e quanto ao mês de Novembro eu tenho as minhas reticências...
Novembro traz lembranças de um tempo no passado num 'mix' de alegrias e tristezas. Bem... para começar, um mês que começa com o dia 'agendado' com uma ida ao cemitério, não é nada emocionante, mas lembro-me de rir muito com a contradição de, sendo feriado, muitos apreciam ir para a Lagoa do Abaeté ( para quem não conhece: situa-se em Itapoã - Salvador-Bahia e é 'cantada' em verso e prosa pelos poetas ) tomar banho de água doce e apesar da sua areia branca circundante, as suas profundezas tragam corpos através da sua areia movediça e escura... E, num dia de prazer é revelada a dor através da perda onde a 'causa mortis' é a teimosia anual em continuarem a 'ir a banhos' desafiando este perigo. Se eu fosse ainda pequenina perguntaria: "Oh mãe, então no dia 1 de Novembro comemoramos os mortos da Lagoa? "
Novembro é ambivalente...
Uma grande amiga nasceu nesta data, mas aldrabou o BI e colocou a data de nascimento no dia 2 e por mais uma razão não gosto deste mês: Hoje, ela não está cá neste mundo para celebrar e eu chorarei eternamente por isso... Novembro foi o seu casamento, Novembro foi o início de um dos meus grandes relacionamentos, Novembro era quando eu viajava, impreterivelmente, para recarregar energias em Amaralina ( para quem não conhece: praia em Salvador - Bahia onde serão deixadas as minhas cinzas ) e envolver-me nos teus beijos...
Em Novembro vibrava qdo já tinha alcançado os 28 pontos necessários para não fazer recuperação da matéria ( para quem não sabe: fica sem saber ;-) é muito complicado explicar ) , Novembro praparávamos para as primeiras festas , iniciávamos o 'trabalho' para o bronze ou iniciávamos o 'trabalho' para a 'recuperação' das notas ... Novembro tinha como preocupação futura onde encontrar as melhores roupas brancas!
Novembro...
Hoje recordo-te com saudade neste 'mix' de alegria e tristeza...
Além disso, passei a rir das bruxas ! Também foi em Novembro que surgiu uma bruxa empoleirada em sua vassoura e tentou alcançar algo que por direito era meu... Caiu ! ;-) ( ok, eu confesso: derrubei-a )

sexta-feira, setembro 30, 2005

Carta nº 11

Carta nº 11 - by Jorge Bucay em " Cartas para Claudia "
Claudia:

« A felicidade consiste em permitir que tudo aquilo que sucede suceda. »

Escreveu-o Barry Srevens.
Agora escrevo-o eu...
Agora torno-o meu...
Agora é meu.

« A felicidade consiste ( sim ! ) em permitir que tudo aquilo que sucede suceda. »

segunda-feira, setembro 26, 2005

Cantico Negro

'Roubado' de alguém que faz parte de 'TUDO' ;-)

CÂNTICO NEGRO
José Régio
"Vem por aqui" -
dizem-me alguns com os olhos docesEstendendo-me os braços,e seguros de que seria bom que eu os ouvisseQuando me dizem:
"vem por aqui!"
Eu olho-os com os olhos lassos,(Há, nos olhos meus, ironias e cansaços)E cruzo os braços,
E nunca vou por ali...
A minha glória é esta:Criar desumanidade!Não acompanhar ninguém.Que eu vivo com o mesmo sem-à-vontadeCom que rasguei o ventre à minha mãe
Não, não vou por aí!
Só vou por onde me levam meus próprios passos...Se ao que busco saber nenhum de vós respondeisPor que me repetis:
"vem por aqui!"?
Prefiro escorregar nos becos lamacentos,Redemoinhar aos ventos,Como farrapos, arrastar os pés sangrentos,
A ir por aí...
Se vim ao mundo,Foi só para desflorar florestas virgens,E desenhar meus próprios pés na areia inexplorada!O mais que faça não vale nada.
Como pois sereis vósQue me dareis impulsos, ferramentas e coragemPara eu derrubar os meus obstáculos?...Corre, nas vossas veias o sangue velho dos avós,E vós amais o que é fácil!
Eu amo o Longe e a Miragem,
Amo os abismos,
as torrentes,
os desertos...
Ide! Tendes estradas,Tendes jardins, tendes canteiros,Tendes pátria, tendes tetos,E tendes regras, e tratados, e filósofos, e sábios...
Eu tenho a minha Loucura !
Levanto-a,
como um facho,
a arder na noite escura,
E sinto espuma,
e sangue,
e cânticos nos lábios...
Deus e o Diabo é que me guiam
Mais ninguém !!
Todos tiveram pai, todos tiveram mãe; Mas eu, que nunca principio nem acabo,Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo.Ah, que ninguém me dê piedosas intenções!Ninguém me peça definições!Ninguém me diga:
"vem por aqui"!
A minha vida é um vendaval que se soltou. É uma onda que se alevantou.É um átomo a mais que se animou...Não sei por onde vou,Não sei para onde vou
Sei que não vou por aí!
"Cântico Negro", poema de José Régio, contido em POEMAS DE DEUS E DO DIABO, aborda a problemática do indivíduo que anseia por sua afirmação a partir da contestação da norma e do afastamento da vivência coletiva despersonalizadora.
O posicionamento rebelde do "eu" o conduz à afirmação de sua individualidade, partindo da contestação da norma coletiva, que se lhe oferece como um convite, até que, tendo estabelecido uma comparação entre os dois elementos opostos, em torno dos quais se desenvolve o texto - a individualidade e a coletividade —, culmina na decisão final de insubordinação à norma.
INTERPRETAÇÃO
1 Inicialmente, consideremos o título, composto por dois elementos: "cântico" e "negro". O primeiro deixa transparecer a idéia de hino em homenagem a um ente de natureza divina ou levado a esta categoria, e assim remete à lembrança dos cantos religiosos do Velho Testamento em louvor à divindade, dos quais sobressai o "Cântico dos Cânticos", atribuído ao rei Salomão; além do mais, o vocábulo "cântico", independentemente de ser entendido como poema, lembra voz, ato de falar. O segundo elemento pode ser interpretado como "escuro", "sombrio", "maldito", "condenado", e os dois últimos sentidos parecem ser os mais cabíveis ao texto em questão.
Ora, a qualidade de "negro" ("maldito", "condenado") não parece ser própria da natureza de "cântico" ("hino"), mas antes advém daquilo que é exaltado; assim, o título como que denuncia a natureza do poema; para que algo seja "maldito" ou "condenado", é preciso que seja encarado a partir da contestação ou negação de um preceito ou ponto de vista vigentes, livres de tal adjetivação. A significação geral do poema diz respeito, portanto, à exaltação de algo ao tempo em que contesta e nega valores vigentes.
2 A abertura da primeira estrofe ("Vem por aqui") tem, evidentemente, um tom imperativo; o verbo dizer ("dizem-me") empregado em seguida deixa que compreendamos a expressão destacada pelo travessão como uma norma a ser obe­decida enquanto a sua repetição em outros momentos do poema (4º e 17º versos: 'Vem por aqui") define o seu caráter de fórmula pronta e acabada que se oferece impositivamente ao "eu".
A indeterminação do sujeito, contida na forma verbal ("dizem—...") e reforçada com o emprego do indefinido ("alguns"), faz-nos pensar em elementos sem definição individual, que têm como ponto comum e objetivo o "Vem por aqui"; em verdade, a norma é o dado concreto no que toca ao sujeito indeterminado, como se todos se tivessem esfumado e diluído como individualidades; outrossim, a pluralidade de "alguns" revela um sentido coletivo; a norma existe enquanto aceita e mantida pela coletividade, que por sua vez baseia sua existência na normatividade, isto é, norma e coletividade mantêm uma relação de dependência recíproca. Por outro lado, a função de objeto exercida pela primeira pessoa deixa-nos entrever que a subordinação à ordem estabelecida pela normatividade coletiva anula a individualidade.
A norma configura-se um convite persuasivo e aliciante, em decorrência do modo como é apresentada ("com olhos doces" — 1º verso) e uma proposta de participação e convivência ("Estendendo-me os braços," — 2º verso). A segurança pressentida na coletividade ("e seguros" — 2º verso) é acompanhada da expectativa de adesão e da dúvida quanto à validade da obediência ("De que seria bom que eu os ouvisse" – 3º verso).
Ao convite à aceitação da norma coletiva, que aparece nos quatro primeiros versos, nos quais verbalização e comportamento se conjugam, segue-se a resposta da primeira pessoa na atitude de enervamento e indiferença ("Eu olho-os com olhos lassos" — 5º verso), ironia e crítica, em "(Há, nos meus, olhos, ironias e cansaços)" — 6º verso, negativa da convivência ("E cruzo os braços" — 7º verso) e de insubordinação e afastamento da norma ("E nunca vou por ali..." — 8º verso).
Contudo, a atitude rebelde do "eu" é assumida a partir do modo de agir da coletividade; contrapondo "olhos lassos" (5º verso) a "olhos doces" (1º verso), e "E cruzo os braços" (7º verso) a "Estendendo-me os braços" (2º verso) e "nunca vou por ali" (8º verso) a "vem por aqui'" (1º e 4º versos), o "eu" revela que seus estímulos não são buscados no íntimo de sua natureza, uma vez que são encontrados no comportamento coletivo, transparecendo assim que sua atitude contrária aos outros, em essência, consiste apenas em não ser os outros.
3 O "eu" justifica a opção "nunca vou por ali" na definição e imposição do seu caráter individual, desde o 9º verso, onde "minha glória" anuncia e exalta uma natureza cuja existência exige a não participação no coletivo ("Criar desumanidade / Não acompanhar ninguém." – 10º e 11º versos), até o final da quarta estrofe.
Negando-se à diluição de sua individualidade no seio da vivência coletiva, o "eu" pretende um programa existencial não orientado pela norma vigente, mas, antes guiado por impulsos que preexistem ao próprio ser (" - Que eu vivo com o mesmo sem-vontade / Com que rasguei o ventre a minha Mãe." – 12º e 13º versos).
A obediência aos impulsos interiores é reiterada ao longo do poema, onde cada metáfora como que aprofunda ou acrescenta novas nuanças. Assim é que em "Só vou por onde / Me levam meus próprios passos..." (14º e 15º versos) a oposição não se esgota ao nível da norma vs impulsos, mas se amplia conhecido vs desconhecido. Ora, vendo-se na norma o princípio disciplinador da vivência coletiva, a obediência a forças incoercíveis (do 12º ao 15º verso) amplifica o caráter contrário do "eu" em relação à coletividade, através da antinomia razão vs instintos. Porém, a insubordinação à norma quando revelada nos versos citados tem um caráter ambíguo: insubmisso à regra, como produto da razão coletiva, o "eu" torna-se sujeito aos impulsos, passando à condição de objeto de seus instintos ("Me levam meus próprios passos..." — 15º verso).
Pretendendo confirmar sua decisão pela obediência aos impulsos, o sujeito afirma "Prefiro escorregar nos becos lamacentos" (18º verso) e "Como farrapos, arrastar os pés sangrentos" (20º verso), como que tendo consciência da virtualidade de dificuldades, graças à singularidade de sua experiência que não lhe permite apoiar-se em vivências alheias, numa disposição viril de enfrentamento da opção. Todavia, a ambigüidade das expressões usadas pelo "eu" deixa admitir outras interpretações; assim, os próprios vocábulos selecionados na composição do 18º verso lembram riscos, quedas, profundidade, metaforicamente remetendo ao mundo interior; por sua vez, o 20º verso tem toda uma significação de desgaste, de aspectos negativos; desta forma, o sentido desses versos está não só ligado à sondagem interior, mas pode ser associado aos resultados negativos da obediência aos instintos.
Dentro de uma perspectiva individualista, capaz de conduzir o discurso poético ao emprego enfático de "meus próprios...", repetidamente ("meus próprios passos" – 15º verso, "meus próprios pés" – 24º verso), o "eu" PREFERE "Redemoinhar aos ventos" (19º verso), explicitando que a natureza de seu programa de vida não é apenas inspirada em forças subjetivas e transcendentes, mas também voltada centripetamente para si mesmo.
A consciência individual comporta, porém, a compreensão de duas dimensões: a do "eu" e a dimensão do mundo onde se coloca ("Se vim ao mundo" — 22º verso). O vir ao mundo, significando viver, é interpretado metaforicamente como "desflorar florestas virgens" (23º verso) e "desenhar meus próprios pés na areia inexplorada" (24º verso), insistindo na unicidade existencial do sujeito, que deve construir sua existência imprimindo-lhe um cunho particular. Entretanto "meus próprios pés" retoma a idéia de ir "por onde me levam meus próprios passos", que, como já vimos, é a expressão da sujeição aos impulsos; sendo assim do ponto de vista do "eu", a razão e a vontade são encaradas como incapazes de criar novas perspectivas existenciais, cabendo às forças incoercíveis esta possibilidade de criar novos rumos ("florestas virgens" e "areia inexplorada"), reiterando a antinomia razão vs impulsos.
"Se ao que busco saber nenhum de vós responde" (16º verso) evidencia a incompatibilidade entre coletivo e consciência individual, em razão da certeza de que sua significação existencial como indivíduo não está na vivência coletiva, que, no entanto, se configura uma programação pronta que lhe é insistentemente oferecida, a ponto de gerar o estranhamento presente em "Por que me repetis: vem por aqui?" (l 7º verso)
A presença impositiva da coletividade é de tal porte que é diante dela que o "eu" se insubordina, pretende tornar-se independente, tentando afirmar-se como indivíduo a partir da dualidade outros vs "eu", e não partindo inicialmente de sua própria natureza ímpar: este conflito traduz-se em repetidas ocasiões no texto, como por exemplo quando o sujeito se dirige a “Vós" (16º, 17º, 26º, e outros versos) como que se definindo diante de um interlocutor coletivo, como se precisasse desses ouvintes de sua insubordinação e afirmação individual para alcançar a veemência necessária; a negativa repetida ("E nunca vou por ali..." –8º verso, "Não acompanhar ninguém," – 11º verso) e enfática em "Não, não vou por aí" (14º verso) demonstra um esforço em direção à imposição da sua unicidade a partir do distanciamento da convivência regida pela norma ("aí", "ali" indicam a visão à distância do "aqui" coletivo), entretanto em todos esses momentos a atenção continua voltada para o objeto de sua crítica e contestação como se a ele estivesse presa: podemos concluir, pois, que se a norma e a coletividade fossem realmente indiferentes ao "eu" não seriam capazes de provocar ironia, crítica, insubordinação.
4 O questionamento crítico que aparece nos três primeiros versos da quinta estrofe introduz a comparação entre os outros ('Vós") e o "eu", que ressalta a incompatibilidade entre esses elementos. A coletividade é acusada de compromisso com o passado ("Corre, nas vossas veias, sangue velho dos avós", — 29º verso) e de acomodação em face da tradição ("E vós amais o que é fácil!" — 30º verso), enquanto o "eu" está voltado para o absoluto, o metafísico ("Eu amo o Longe e a Miragem," — 31º verso) e para a sondagem interior, para o desafiador ("Amo os abismos, as torrentes, os desertos..." — 32º verso).
Por seu turno, a citação dos elementos componentes do universo e do espírito da coletividade, do 33º ao 36º verso, define o caráter relativo e extrínseco dos valores existenciais, numa evidente oposição a "Loucura", como elemento metafísico, e "espuma, e sangue, e cânticos nos lábios..." — expressões do interesse pelo absoluto e pelos impulsos e valores intrínsecos, estabelecendo, assim, uma nova antinomia: relativo vs absoluto.
5 Em "Deus e o Diabo é que me guiam, mais ninguém." (40º verso) o significado do experienciar é colocado mais uma vez num plano metafísico; "Deus e o Diabo", forças indestrutíveis e absolutas, significando Bem e Mal, são anteriores a "regras", "tratados," "filósofos", "sábios", etc. que se constituíram na tentativa de aceitar uma (Bem -"Deus") e excluir, ou talvez simplesmente disciplinar, a outra (Mal — "Diabo"); tentativa esta que se revela inútil pois essas entidades (Deus, Diabo) coexistem, apesar de serem contrárias. A aceitação de forças absolutas como guias existenciais reitera a precariedade dos valores relativos aceitos pela coletividade ("pátrias", "tectos", "regras", etc.). Por sua vez os elementos "pai" e "mãe" (41º verso), como transmissores da vida e tradição, têm o seu caráter físico e relativo ressaltado graças aos versos seguintes (42º e 43º versos). A ambigüidade de "Mas eu, que nunca principio nem acabo, / Nasci do amor que há entre Deus e o Diabo" (42º e 43º versos) leva-nos a pensar em um primeiro momento na oposição que aí se estabelece em relação a ter nascido de "pai" e "mãe"; ora, o "eu" como ser humano também provém de pai e mãe, portanto o entendimento não pode ser esgotado neste nível; outra idéia nos ocorre quando levamos em conta o "eu", nascido de "Deus" e do "Diabo", como síntese desses elementos contrários, por conseguinte guardando características de ambos, revela-se como algo novo, cuja natureza opositiva em relação ao velho é uma constante. Outrossim, a sétima estrofe amplifica a antinomia relativo vs absoluto de modo a fornecer a expressão mais veemente da dimensão do indivíduo, cujas natureza e existências são regidas por forças transcendentes, capazes de gerar impulsos da maior nobreza ("Deus") e da maior velhacaria ("Diabo")
O conhecimento e a aceitação de forças absolutas como impulsionadoras do existir conduzem o "eu" à decisão final por uma experiência de vida cujo caráter individual é impossível de ser cerceado ("A minha vida é um vendaval que se soltou. / É uma onda que se alevantou. / É um átomo a mais que se animou..." -do 47º ao 49º verso), e é intransferível ("Ninguém me peça definições '." — 45º verso), retomando assim sua insubordinação à norma coletiva na verbalização — "Sei que não vou por aí!" (52º verso).
CONCLUSÃO
O processo evidenciado em todo o poema resulta da incompatibilidade entre vivência coletiva e consciência individual, e seus valores respectivos, como atitudes existenciais que coexistem, mas que se excluem

segunda-feira, setembro 19, 2005

"Tudo o que é reto mente. Toda verdade é sinuosa. O próprio tempo é um círculo."(F. Nietzsche)


Lembrei-me dos bons tempos de conversas no fórum do Sapo... da Leonor e os seus clones a 'brigarem' pelo Nietzsche , pelo Dostoievski e tantos outros...

Já não há Fóruns a 100%... vivemos cada um no seu espaço... no seu blog... no seu fotolog... no seu 'journal' e agora nos vlogs...

A administração já não é a mesma...

segunda-feira, setembro 12, 2005

Magnitudes...

Após a Independência no dia 7 de Setembro, nem tudo tornou-se independente...
Apetece-me escrever:
'magnitude' o caraças...
EU estou aqui onde deveria estar
EU estou assim, como não deveria estar,
portanto...
Prozac, sff
on the rocks

segunda-feira, agosto 29, 2005

De afrodisíacos
Adélia Prado
Tenho um pouco de pudor de contar, mas só um pouco, porque sei que vou acabar contando mesmo. É porque lá em casa a gente não podia falar nem diabo, que levava sabão, quanto mais... ah, no fim eu falo. Coisa do Teodoro, ele quem me contou, você sabe, marido depois de um certo tempo de casamento fala certas coisas com a mulher. O seu não fala? Pois é, e de novo tem um tempão que aconteceu. Lembra aquela história dos queijos? Igual. Demorou um par de anos pra me contar. O pessoal dele é assim, sem pressa. Tem uma história deles lá, que o pai dele, meu sogro, esperou 52 anos pra relatar. Diz ele que esperou os protagonistas morrerem. Tem condição? Mas o Teodoro — foi quando a gente mudou pra casa nova — teve de ir nas Goiabeiras tratar um marceneiro e passou, pra aproveitar, na casa da tia dele, a Carlina do Afonso, e encontrou lá o Gomide. Tou encompridando, acho que é só por medo do fim, mas agora já comecei, então. Então, diz o Teodoro, que o Gomide tirou do bolso do paletó uma trouxinha de palha de milho, cortadas elas todas iguaizinhas e amarradas com uma embirinha da mesma palha. Escolheu, escolheu, pegou uma bem lisa e bem branquinha, tirou o canivete do outro bolso, lambeu a palha pra lá, pra cá, e ficou um tempão lhe passando firme a lâmina, do meio pras pontas, de ponta a ponta, entremeando com lambidas. Depois, ainda segurando a palha entre os dedos, foi a hora de tirar e picar o fumo de rolo bem fininho. Ia picando e pondo na concha da mão. Acabou, guardou o rolo e ficou socavando o fumo na mão com a ponta do canivete. Depois pegou a palha, mais uma lambida e foi pondo nela o fumo, espalhando ele por igual na canaleta formada, pressionando bem pra ficar bem firme. Deu mais uma lambida na parte mais próxima do fumo e com os polegares e indicadores foi enrolando o cigarro devagarinho, uma enrolada e uma lambida, uma enrolada e uma lambida. Com o canivete dobrou uma das pontas para o fumo não escapar, tirou a binga do bolso, acendeu e pegou a pitar. Agora é que vem, ai, ai. Teodoro falou que o tempo todo da operação ele não despregava o olho daquilo. Disse que nem sabe o que tia Carlina arengava, só punha sentido no Gomide fazendo o pito. Diz ele que foi uma coisa tão esquisita — esquisita, não —, tão encantada que ele ficou de pau duro. É isso. Falou também que ficou doido pra sair dali, comprar palha, fumo de rolo e repetir tudo igualzinho ao Gomide. Eu entendo. Quando conheci o Teodoro, ele fumava e eu achava muito emocionante. Tenho muita saudade de quando não existia essa amolação de cigarro dar câncer, nem de mulher ser magra. A gente tinha mais tempo para o que precisa, não é mesmo? Será que faz mal mesmo? Colesterol, depois de tanto barulho, estão falando que já tem do bom. Qualquer dia vou pedir ao Teodoro pra dar uma fumadinha, só pra fazer tipo.
Texto extraído do livro "Filandras", Editora Record - Rio de Janeiro, 2001, pág. 53.

terça-feira, agosto 23, 2005

Tudo sem um todo...



De que vale TUDO sem um todo ?
O conceito de tudo pode abranger um espaço meu que difere do teu...

Ser todo(a) teu(tua)
não é(será) necessariamente
ter tudo...
falta
estar todo...
completamente...



...portanto...

não teremos tudo...
...esperamos ter todo o contexto
para que nos seja permitido
TUDO


[ ora bolas, que conversa mais inexorável... ]

Freedom

Liberdade...
Querer estar
e não, necessariamente, ir para.
Provavelmente, sair de.
Tipo: não procurar e simplesmente encontrar...
Contraditório...
Ambivalente... ( claro ! )
Oportunidade de [se] permitir
de esquecer prioridades
de ousar à primeira percepção...
Qual fenomenologias...

terça-feira, agosto 09, 2005





...não se sabe as razões, apenas há um mistério à volta deste fenómeno antigo: a mala das mulheres...um enigma para os homens...uma salvação para as mulheres... ali encontramos tudo, mas nem todos conseguem ter acesso...lembro-me que qdo tinha os meus 14 anos e perguntavam-me o que tinha na mala respondia sempre: estou pronta para viajar para a Grécia...sabe-se lá porque eu respondia isso...mas sentia-me segura e pronta para qualquer intempérie e nunca duvidei que poderia de facto ir parar à Grécia a qualquer instante...nada detém o poder da mala feminina...o seu conteúdo é pessoal e os seus itens de valor incalculável...sinto-me nua sem aquele conteúdo...conteúdo?...ops...nem sequer sei o que realmente lá dentro se encontra...apenas sei que está lá...e isso conforta-me...

segunda-feira, agosto 08, 2005

Rebirth


Diz Alexander Lowen:


O comportamento natural do ser humano é estar aberto à vida e ao amor. Entretanto, a nossa cultura fez-nos acreditar que não é assim, que devemos estar fechados e desconfiados. Pensamos que, ao agir desta maneira, não seremos feridos pelas surpresas da vida - mas, na verdade, o que acontece é que não estamos a aproveitar nada.

terça-feira, agosto 02, 2005



RESET ........

segunda-feira, maio 30, 2005

Copy Paste imperdível...

Amar não acaba - Frederico Lourenço
Parte 2 - 'prenda' de um grande amigo de sempre...


Amar não acaba é uma crónica pessoal sobre a adolescência, na qual Frederico Lourenço rememora, numa mistura desarmante de candura e humor, a descoberta da sexualidade e o consequente reajuste interior do papel da fé católica, as complexas relações familiares, a escolaridade feita por conta própria fora da escola, as primeiras grandes paixões musicais e a influência de Lanza del Vasto.

À medida que o tempo passa, a vida parece-me ir adquirindo os contornos esfumados do Embarque para Citera pintado por Watteau, paisagem feérica povoada de figuras irreais à espera do amor, como que saídas das páginas de um pequeno Saint-Simon do sentimento, cronista da emoção e de mim próprio.

Imprensa
“Uma pequena pérola ‘proustiana’, com um sopro de Clarice Lispector no título, para contar infância e adolescência em pequenos folhetins, com uma elegância exacta que já não se usa. Do pícaro avô da marinha mercante ao devaneio ‘hare krishna’, da descoberta da (homo)sexualidade à interrogação da igreja, passando pela Figueira da Foz (mas o que é que as pessoas da Figueira têm?), por Sintra e por São Carlos (Wagner, os bailarinos da CNB, Mara Zampieri). Abre-se para espreitar e de repente acaba. Difícil é não o ler.” Alexandra Lucas Coelho, Público

“Percursos iniciáticos, contados na primeira pessoa, por um especialista em cultura clássica, tradutor de Homero, além de outras surpresas. A descoberta da sexualidade, da espiritualidade hindu (rapidamente esquecida), da morte, da música e da amizade, num breve texto de extraordinárias delicadeza e ironia, criando um novo espaço de excepção no nosso panorama literário”. Expresso

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Frederico Lourenço nasceu em Lisboa, em 1963. Licenciou-se, em 1988, em Línguas e Literaturas Clássicas na Universidade de Lisboa, onde se viria a doutorar (1999) com uma tese sobre os cantos líricos de Eurípides. É membro do corpo docente da Faculdade de Letras desde 1990. Além do estudo da poesia grega, tem-se dedicado à exegese da obra de Platão e Camões. Colaborou com a Cinemateca Portuguesa na elaboração de textos sobre cinema e na feitura de vários catálogos. Publicou ensaios de crítica literária nas revistas "Journal of Hellenic Studies", "Classical Quarterly", "Euphrosyne", "Humanitas" e "Colóquio-Letras". Foi colaborador dos jornais Independente, Expresso, Público e, presentemente, da revista "Os Meus Livros". Traduziu também duas tragédias de Eurípides, Hipólito e Íon.
Publicou nos Livros Cotovia a trilogia de romances Pode um Desejo Imenso, O Curso das Estrelas e À Beira do Mundo, obras pelas quais foi distinguido com o prémio PEN Clube 2002. Em Maio de 2003, saiu a tradução em verso da Odisseia homérica, que ganhou o prestigiado Prémio D. Diniz da Casa de Mateus, assim como o Grande Prémio de Tradução - APT (Assoc. Port TRAD)/ PEN Clube 2003.
Actualmente, traduziu a Ilíada homérica, também em verso.

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Mas o motivo de falar deste livro... é tambem falar desta interessante entrevista que Fredericou Lourenço deu ao jornal Diário de Noticias de 12 de Dezembro de 2004.
Vale a pena a ler... e reflectir...

A ideia de amor ou o tapete mágico da imortalidade
Toda a sua obra tem-se construído sob o signo do amor. Amar não Acaba, acabado de publicar, a trilogia romanesca e muitos dos ensaios da Grécia Revisitada passam por aí. Como relaciona o amor com a felicidade?


Fazer do amor um assunto académico e universitário foi difícil. Falar dele num contexto romanesco, de ficção e de escrita criativa talvez seja normal, mas, em Grécia Revisitada tudo o que escrevi sobre Platão, o Banquete e Fedro, e mesmo sobre a tragédia, dir-se-ia uma tentativa de compreensão da mecânica amorosa, das emoções. É um tema que me obceca, talvez por sentir que aí está a chave da felicidade, não possível sem o amor.

Mas o amor é um caminho árduo...

Que tem de ser descoberto, devemos tentar abrir janelas como se o amor fosse o dia e nós estivéssemos às escuras. Mesmo o título deste último livro, Amar não Acaba, passa por aí. Mas este processo criativo foi irracional. Há, de facto, essa continuidade da temática amorosa, até quando penso em romances futuros. Tudo gira em torno de uma arqueologia das emoções.

Não deixa de abordar a intangibilidade da felicidade...

Todos nós temos momentos de felicidade, mas ela não é possível no sentido de uma beatitude total, de continuidade. Os gregos reuniam muitas coisas no conceito de felicidade, o amor não. A palavra que em grego significa felicidade é sinónima da que quer dizer riqueza. Para mim, felicidade sem amor não pode existir e este pode impor-se mesmo quando não está a acontecer no caso de um amor que venha de trás, ou que projectamos para a frente.

É uma Ítaca, o amor?

Sim, uma Ítaca, ou uma ideia de Deus. Sinto na minha vida o amor de Deus, se bem que não o mereça.

Sente esse amor como uma graça?

Sim, no sentido de ser algo inexplicável. Não entendo por que razão sinto a minha vida tão preenchida, tão acompanhada por essa presença divina. Mas sinto-a, muito.

Como liga essa presença divina ao estigma da caducidade a que o amor está associado, como diz Clarice Lispector?

Essa frase é talvez a única do livro perante a qual me interrogo. Será que a deveria ter reformulado? É Clarice quem diz amar não acaba...

Amar não acaba, mas o amor pode acabar. O amor, sobretudo o amor/paixão, não insere em si a perda?

Na minha experiência pessoal, nunca deixei de gostar das pessoas que foram importantes para mim. As relações foram evoluindo num sentido diferente. Tudo na vida está sujeito ao estigma da caducidade, só amar não acaba, não é? O amor dir-se-ia esse tapete mágico da imortalidade, ideia que pode aparecer em Platão, como uma força especial que nos pode levar do mundo sensível para o mundo inteligível. O caminho da transcendência, do divino, está nele também.

E há ou não o Grande Amor na acepção de Safo (como experiência cíclica, repetiva), o tal engano que a poesia greco-romana explorou?

Isso dava um romance. É difícil distinguir o que os gregos querem dizer, porque em grego eros quer dizer amor e sexo. Os autores gregos quando falam do amor e da paixão não se estão a referir à descoberta da pessoa certa. Fascinou-me no Banquete a ideia da procura da cara-metade por não se tratar de uma ideia profundamente grega que encontre eco no resto da literatura. Pode até ser interpretada como tendo sido apresentada por Platão a título paródico. Há quem considere o discurso de Aristófanes cómico e não será por acaso que o terá posto na boca de um comediógrafo. Mas é mais a partir dessa concepção, a da procura da outra metade, da associação da felicidade à plenitude quando encontramos a pessoa certa que amor e felicidade se juntam no ideário grego. No fundo, é só aí, como digo em Grécia Revisitada, porque no próprio Banquete Platão oscila entre as duas ideias do amor a acepção pré-romântica de Aristófanes e a do interesse sexual por outra pessoa.

Já o mito de Tristão dir-se-ia essa espécie de febre maligna que o lirismo ocidental cantou...

Trata-se do amor que só atinge a plenitude na morte. Tristão e Isolda é o mito por excelência do amor--morte eros, tânatos. Também não é uma ideia muito grega, nem que venha ao encontro da minha sensibilidade, embora seja fascinante. O que mais me interessa nesse mito é a pessoa por amor ser capaz de deitar tudo a perder. Foco esse tema de uma forma mais modesta em O Curso das Estrelas, quando Nuno e Concha estão na Capela da Arrábida. Nuno tem essa sensação de que seria capaz de pôr tudo em causa em prol dessa ilusão de amor. Só anos mais tarde, no À Beira do Mundo, se concretiza.

Aí pressente-se, não diria uma angústia metafísica, mas uma inquietação. Falamos de fé e não de religião?

Vejo o mundo com misticismo. Mas, tem razão, falo muito mais de fé do que de religião.

Existe uma ligação à transcendência que atravessa a sua obra, mas associada a uma desintegração da religião na qual foi educado, ou não?

Sim e não. Raramente vou à missa, mas passo muitas vezes por igrejas onde fico a rezar. Tenho, de facto, uma vivência da religião que está desadequada da convenção, da hierarquia, porque a minha sexualidade está em conflito com a maneira católica de a entender. O catolicismo tem muito a progredir nesse campo, embora seja mais aberto do que o cristianismo ortodoxo. Este último vê a homossexualidade como algo satânico. Condenação imediata ao inferno!

Viveu esse conflito, esse choque entre religião e sexo?

Ah, sim, eu adoraria ser católico praticante, ir à missa senão todos os dias, pelo menos uma vez por semana. A maior parte das pessoas que sai da Igreja é por falta de fé. Deixa de se acreditar. Nunca passei por isso. Vou envelhecendo e a fé vai-se consolidando.

Talvez por isso lhe tenha interessado explorar no romance a espiritualidade das relações interpessoais?

Isso interessa-me muito, as emoções, tentar cartografar como as pessoas sentem. Esse é o meu lado de psicólogo, de psicanalista que procura dar, ao mesmo tempo, uma dimensão espiritual.

Se Pausânias, no seu discurso, inclui o tema do amor celeste, exclusivamente homossexual, e considerando Aristófanes a heterossexualidade e a homossexualidade como igualmente naturais, não é só a questão da sexualidade que está em causa?

Claro que não, mas estamos a falar de sexo e de género. Pausânias, ao dizer que há um amor elevado e outro rasteiro, exclui a heterossexualidade dessa dimensão.

Mas essa não é a sua conclusão?

Não, a minha não, mas Platão tenta dizer que a prática verdadeira da filosofia é incompatível com a vida convencional. Todos os seres humanos são grávidos, uns do corpo, os que têm filhos, e os da alma, os homossexuais, que não constituem descendência. Diz depois que da gravidez da alma nascem a filosofia, os grandes poemas... Há uma tentativa de ver as coisas a preto e branco, uma falha a meu ver.

Muito misógina...

Sem dúvida. A cultura grega era misógina.

Há uma ligação entre a concepção helénica de beleza, de que fala em Deleite Estético, e o seu Pode Um Desejo Imenso. Amar também é ver?

Nuno age, perante a beleza de Filipe, como se ele fosse um objecto estético. Na história de Nuno e Vicente, que acaba no À Beira do Mundo, não é assim. Não será tanto a questão do ver que importa. Filipe, por outro lado, já está desfigurado pela doença, o que demonstra a escada do amor platónico. Nuno começa por se fascinar perante a beleza de Filipe, este vai ficando desfigurado, mas amar não acaba.

Faz todo o sentido ligar-se a experiência amorosa da sua trilogia ao Banquete, de Platão...

Claro que faz, sobretudo quanto à escada do amor. No Pode Um Desejo Imenso, pus esta questão na boca de várias personagens. Trata-se de uma caminhada em que a verdadeira beleza não é a física, mas a anímica, a da alma.

Este último livro, centrado na adolescência, embora escrito depois, dir-se-ia um embrião da trilogia...

Talvez porque seja natural, para os leitores, confundir Nuno Galvão com Frederico Lourenço. No fundo, o Frederico do Amar não Acaba pode ser o Nuno adolescente.

Detém-se neste seu livro também na descoberta e vivência da sexualidade, em particular da homossexualidade. Ainda existem guetos para ela? Como é a condição do homossexual?

Nunca senti a minha liberdade coarctada, mas não sou a melhor pessoa para falar nisso. Vivo, no quotidiano, num ambiente quase cem por cento heterossexual.

Não estou a falar de lobbies, mas de guetos... Da exclusão.

Sim, isso sim, há pessoas que sofrem por serem excluídas do mundo heterossexual, eu não. Se trabalhasse num banco, ou na tropa, talvez fosse diferente. Na Universidade, nunca o senti. Mas sei que existe esse tipo de discriminação. Sou, de alguma forma, um privilegiado, familiar e profissionalmente.

Sente-se excluído da Igreja Católica?

A Igreja Católica não entende a homossexualidade, como a sociedade e a própria comunicação social. Há ideias estereotipadas. Um pai e uma mãe têm de lidar com esse estigma porque foram educados no preconceito. Nos países do norte da Europa, nas cidades é uma coisa, nas aldeias outra. Em Munique, os casais andam de mão dada, numa aldeola dos Alpes bávaros não. Não acredito que a sociedade alguma vez mude radicalmente.

Os seus últimos anos foram dedicados a Homero. Traduziu a Odisseia, está a traduzir a Ilíada. Homero eclipsa-se, no entanto, dele pouco se sabe, enquanto Ulisses simboliza a condição humana...

O mais interessante não é saber quem foi Homero, mas o texto. Dediquei os meus últimos anos a Homero e farei ainda um comentário à Odisseia, canto a canto, após a tradução da Ilíada, mas o texto poético da Odisseia é tão arrebatador que não tem de se explicar tudo. Funciona como poema que não foi concebido para ser estudado e lido à lupa como fazemos hoje. Continua a ter essa força.

No fundo, está lá tudo, a dor, o luto, a memória, o sofrimento, a ausência...

O amor, as relações familiares, a viagem. Talvez a Ilíada seja um poema mais profundo do ponto de vista da tragicidade da vida humana. E Homero, como corifeu da tragédia, tem essa dimensão, a da caducidade da vida. O desdém dos deuses pelos homens é impressionante. Diz um deus a outro que, de todas as coisas que rastejam sobre a Terra, nenhuma é mais abjecta do que o ser humano, porque tenta imitar esse lado divino. A ideia de que há uma centelha divina nos seres humanos diz-me muito.

Na Ilíada há uma maior dramaticidade do que na Odisseia, par a par com a faceta bélica?

Ambos os poemas são dramáticos, mas a Ilíada talvez seja um pouco mais; diria mesmo trágica. É mais densa, mais profunda e abrange muitas áreas da vida humana. Caminha para o lado mais escuro, o da vida tendo como fim a morte.

Temos falado de sentimentos. Acha que o seu processo de manifestação muda da Odisseia para a Ilíada?

Os sentimentos da Ilíada são mais avassaladores, mais profundos, talvez porque a morte esteja presente em tudo. Não que isso não aconteça na Odisseia, porque culmina com a carnificina dos pretendentes por parte de Ulisses, mas aqui a morte é mais cinematográfica. Na Ilíada, a morte dá a tónica à vida, à relação entre marido e mulher, pai e filho, entre amigos... É o elo, aquilo que define os sentimentos.

Como encara o acto de traduzir? Há um lado técnico, que supera uma poética, ou não? Como concilia técnica e arte?

Na tradução de Homero, o mais importante é a técnica, porque tem de haver uma coerência e uma consistência muito grandes na linguagem. Inventei uma dicção em português para imitar a dicção homérica na Odisseia. Na Ilíada, segui o mesmo caminho. Tenho pouca liberdade, porque devo obedecer às regras que eu próprio inventei. Gostaria que quem não tem possibilidade de ler Homero na língua original estivesse na tradução portuguesa o mais perto possível do texto em grego. Isso não tem a ver com inspiração. Depois há o lado mais irracional, a musicalidade das palavras.

Frederico Lourenço é um ficcionista, não um poeta. Não sente a ausência desse lado quando está a traduzir?

Quando estou a traduzir Homero sou um poeta. Um poeta para essa finalidade. Um helenista e um poeta, sou um pouco o autor-poeta da tradução da Odisseia e da Ilíada.

Então não há uma oposição entre criador e tradutor? É como tocar um instrumento, tocou piano, toca cravo...

Tentei que essa oposição fosse a menor possível, que a poesia se sobrepusesse à disciplina, mas, como num instrumento, tem de haver a técnica e a arte. Não chegam a musicalidade e a inspiração. Aprendi muito com o piano e a música, sobretudo a ter capacidade de trabalho e disciplina.

Há um desejo de assimilação e de transformação no tradutor?

Pode existir essa tentação. A assimilação é necessária, tenho de interiorizar o texto homérico, para não fazer apenas uma tradução correcta. A transformação é a tentação de mudar alguma coisa. Isso é inevitável. Não emprego uma linguagem pseudoquinhentista, pseudocamoniana. Os meus modelos foram muito mais Sophia, Ruy Belo, Eugénio...

Que lugar ocupa a leitura na sua vida?

O número um. A leitura só dá prazer, a escrita dá muito sofrimento.

Que lhe agrada num escritor?

Tem de ter uma estética interessante. Se for português, que escreva a língua portuguesa de uma maneira que me dê esse prazer que sentimos quando ouvimos música. É difícil existir, num romance, uma história aliciante contada num português feio.

Viver é perigoso, escreveu, um dia, Virginia Woolf, escrever também, disse Clarice Lispector. Vida e escrita funde-as como?

Nessas duas autoras, a vida e a escrita não estão separadas, então em Clarice isso é evidente. Não a vida vivida por fora, mas por dentro. Clarice levou a língua portuguesa ao âmago das coisas. A escrita da Virginia é mais atenta ao que se passa ao nível da percepção exterior. Quanto a mim, vida e escrita fundo-as nos livros. Tenho dificuldade em escrever sobre coisas que não me interessam directamente. Só consigo trazer cá para fora o que está dentro de mim. Tenho de me pôr a mim próprio no centro. A minha vida e a minha escrita estão totalmente entretecidas.





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Sinto, apenas...

sexta-feira, janeiro 28, 2005

Livros...

" Amar não acaba "

Título do livro de Frederico Lourenço

A propósito... tenciono deambular sobre esta questão... afinal,será mesmo assim?
Um homem ama uma mulher... uma mulher ama os seus 2 filhos... uma mulher ama um homem... a filha ama o pai e a mãe...
tudo isso apenas para questionar:
Prq o amor entre o homem e a mulher só pode ser 1 versus 1... one by one...enquanto as outras vertentes amorosas podem ser duplicadas, triplicadas e distribuídas de emoções...

se... amar não acaba...

segunda-feira, janeiro 24, 2005

Perfis

O que somos capazes de fazer por um pouco de serenidade e paz...

Bem...
Eu...
Tem de ser...
Apaguei os meus perfis que estavam a navegar ...

Não os uso...

A borboleta quer voar... imagine as possibilidades...